quinta-feira, 25 de outubro de 2012

O Fantasma do Banheiro - Parte Final


                Naquele ano, o Baile de Despedida foi cancelado porque não havia clima para comemorações. A imagem de uma garota mutilada e sem vida não saía da mente de Nando. Ágata morta. Ferida, decomposta, sua carne sendo consumida por vermes de cadáver. E a culpa era dele.

                Quando terminou o colégio, pensou que o pesadelo tinha terminado. Porém, dormindo ou acordado, ainda era assombrado pela imagem da amiga morta. Estava quase enlouquecendo quando decidiu que deveria haver uma forma de se livrar da culpa. Ou, pelo menos, de esquecê-la. Seguiu sua vida, empenhando-se ao máximo na construção de uma carreira. Estudou, namorou, viajou, se formou. Dedicou-se à sua antiga paixão colegial: a História. Tornou-se professor, construiu seu império e, de tanto se apropriar de gloriosas aventuras alheias, esqueceu-se de sua própria história inacabada.

- - -

                E ali estava ele. De volta ao Vladmir Feitosa e àquele mesmo prédio. Todo um esforço de anos para bloquear lembranças indo por água abaixo. Foi então que viu o professor César surgir na ponta do corredor e, sem pensar duas vezes, entrou no banheiro feminino.

                Na mesma hora teve o impulso de retornar, mas já era tarde. A voz chorosa que conhecia tão bem chegou aos seus ouvidos:

                - Quem está aí?

                Suas pernas paralisadas o impediram de sair correndo quando o espectro de Ágata atravessou a porta da última cabine. Orlando percebeu que não estava surpreso. Parecia saber que aquilo tinha de acontecer. Era como se todos os episódios de sua vida desde a morte de Ágata o tivessem levado até aquele momento. Observou com atenção a figura bruxuleante do que outrora fora sua amiga. Cautelosamente, aproximou-se.  Nenhum verme, nenhuma mosca. Nada de cicatrizes ou partes em decomposição. Continuava igualzinha à Ágata de quem se lembrava.

                Em um movimento quase involuntário, moveu o braço no velho gesto de acariciar as pontas de suas marias-chiquinhas, porém a sensação foi a de tentar agarrar uma corrente de ar gelado.

                - Ágata... você está...

                - MORTA, EU SEI! – esbravejou o fantasma, contorcendo o rosto em uma terrível expressão chorosa.

                - Não. Eu ia dizer... linda.

                Encararam-se em silêncio por mais um minuto. Nenhum dos dois saberia descrever o que estava sentindo.

                - Ágata, me perd...

                - Não peça perdão. O garoto que me magoou não existe mais. Nando não existe mais. Agora quem existe é Orlando, o professor de História novo que, apesar de parecer bem arrogante, tem um belo sorriso. Fofocas de banheiro. As garotas não se cansam de repetir desde que você chegou.

                - Então, estou perdoado?

                - Nando está perdoado. Você eu não conheço. E nem quero conhecer.  – dizendo isto, virou as costas e tornou a desaparecer pelas tubulações.

                Ainda estava digerindo aquelas palavras quando ouviu um clique. A porta do banheiro se abriu, dando passagem a uma garota gordinha de olhos vermelhos.

                - P-Professor Orlando?! O que o senhor está fazendo aqui?!

                Por um segundo, perdeu as palavras.

                - Oh, que distração a minha! Acabei entrando no banheiro errado! – ia se encaminhar para fora quando a percepção de lágrimas no rosto da aluna despertou algo dentro dele – Mas me diga, querida. Por que está chorando?

                - Ah, não é nada. Uns garotos babacas andaram comentando umas coisas sobre o meu peso e...

                - O quê?!  Não estou acreditando! Como um garoto poderia ser capaz de dizer algo indelicado a respeito de uma garota tão linda quanto você?

                A garota corou e não pode conter um sorriso.

                - Puxa, obrigada, professor! B-Bem, agora preciso ir. – bem nessa hora, um pedaço de papel caiu de suas vestes. Não teve tempo de impedir que o professor o pegasse. Corou mais ainda quando o professor passou os olhos por sua singela declaração de amor a um colega de classe.

                Ao perceber o desconforto da garota, Orlando devolveu o papel, sorrindo.

                - E nunca se esqueça, querida. – não estava usando seu usual tom pomposo. Pela primeira vez em muito tempo, estava falando sério. - Se algum boboca a magoar, me chame. Eu o ensinarei como é que se deve tratar uma dama.

                O rosto da garota se iluminou, mesmo sabendo que nunca chamaria o professor para tal fim. Agradeceu mais uma vez e se retirou, apertando o pedaço de papel com força contra o peito.

                - É, acho que você tem razão, Ágata. - murmurou para si mesmo. – Nando não existe mais.

                Estava se encaminhando para fora quando algo lhe ocorreu. Tirou uma caneta do bolso, desta vez junto com um pedaço de papel. Escreveu nele e o deixou em cima da pia antes de finalmente se retirar. Se distanciou do banheiro o mais rápido que conseguiu enquanto pensava nas palavras que diria à diretora para justificar seu pedido de demissão.

                Assim que o professor fechou a porta, Ágata saiu da cabine e se dirigiu à pia. Encarou o pedaço de papel por alguns instantes. Um pequeno corpo luminoso em forma de gota rolou de seus olhos.

                “Eu também te amo. Assinado: Nando.”

FIM

obs¹: conto de minha autoria 
obs²: originalmente, escrevi esse conto como uma fanfic de Harry Potter, sendo Ágata a Murta-que-Geme e Orlando o professor Gilderoy Lockhart (cujo apelido dado pela Murta era Roy). E a menina que entra no banheiro no final era Hermione (e zoavam ela pelos dentes, e não pelo peso). Claro que tive que fazer algumas alterações para "tirar" a história do universo de Harry Potter. Na primeira versão, por exemplo, foi Voldemort (como Tom Riddle adolescente) quem causou a morte da Murta (como nos livros) e tinha todo um contexto, haha. 
obs³: obrigada por ler! :D

5 comentários:

  1. Amei o final da história, ficou muito bom!!!
    Adorei saber que era uma fic de Harry Potter, AMO!! Ainda mais com o Lockhart, muito original, nunca vi uma fic com ele, haha.
    Enfim, adorei mesmo!!!
    Beijinhos

    Ann
    http://www.vinteepoucos.com.br/

    ResponderExcluir
  2. Obrigada mesmo, Ann, por ler e comentar! ^^
    Eu tenho um grupo de amigas que gosta de escrever fanfics de Harry Potter de uma forma bem... original, haha.

    ResponderExcluir
  3. Gente amei né, ainda não li, vou pegar do inicio, mas amo gente que escreve *---* é dificil achar alguém que escreve, que goste de ler tem bastante, mas que escreva não né? ^^ Eu também escrevo umas coisas ali, outras aqui, conhece o recanto das letras?

    Vou seguir seu blog, porque achei super fofo ^^
    Passa no meu se quiser, tem conto também!

    www.jessicawilhelm.com

    Beijo!

    ResponderExcluir
  4. Chorei :'( é muito fofo! Eu curti de mais! Parabéns! Continue escrevendo pra gente, adoro de mais ler historias escritas por pessoas "comuns"
    Quando digo comuns, quero dizer que foi escrita não por profissionais formado em letras e pós graduado em literatura sabe? Pessoas assim é comum escrever bem, você escreve MUITO BEM, adorei mesmo! Beijo!

    ResponderExcluir
  5. Nossa, Jessica, obrigada mesmo! Fiquei muitíssimo feliz com o seu comentário e surpresa também! Com certeza, quando escrever mais postarei no blog *-*

    Visitei seu blog e já virei seguidora, puro amor *O*

    ResponderExcluir

Oi, queridos! Aqui é seu espaço, podem colocar os pés no sofá.